22/12/2003

Momentos do ano

É a primeira vez que faço isto e ainda não sei bem por onde começar... O que me foi proposto foi escolher os meus 10 discos do ano. Confesso que este foi talvez o ano em que poucos discos lançados este ano comprei, infelizmente o mercado está bastante inflacionado e, cada vez mais, temos de olhar para as etiquetas "Preço Verde" e "Preço de Amigo", que normalmente rondam o preço aceitável por um disco (entre 12 a 16 euros). Com os preços praticados e com a falta de emprego (limito-me a estudar em horário quase-pós-laboral), esta selecção fica bastante dificultada.
Achei, contudo, que não devia referir apenas discos do ano mas também momentos...

O momento extremamente negativo de 2003 foi a não-existência do festival Ilha do Ermal. Se por um lado um dos momentos mais negativos de 2002 foi a forma como o público reagiu aos Nickelback, por outro lado é importante e faz falta um espaço onde o Nu-Rock e outros sons mais "pesados" tenham um lugar de destaque. O meio underground do metal é, talvez, aquele que tem maiores dimensões em Portugal e a existência de um festival que faça uma maior aproximação a esse público é totalmente justificado e louvável.
Também extremamente negativa foi toda a polémica em torno da Orquestra Metropolitana de Lisboa, da qual gosto particularmente. Não tenho dúvidas que, uma vez reposta a credibilidade da instituição, esta continuará a ser a maior e melhor Orquestra portuguesa, seja com que maestro fôr.
Em termos de rádio foram globalmente negativas as (novas) mudanças radicais no seio do grupo Media Capital Rádio (MCR), que voltou a trocar as voltas aos ouvintes. Nestas mudanças apenas o público mais novo de Porto, Coimbra e Lisboa é que fica contemplado com o canal dirigido a eles (a Best Rock, à semelhança do que acontece com o canal rebelde do grupo Renascença, maior rival do MCR); recriou o enfadonho Rádio Clube Português (que, apesar de ter sido o canal que deu origem à revolução de Abril, foi até essa madrugada uma rádio ao serviço do regime) mas que em pouco difere da antiga Nostalgia, apesar de ser dita generalista; a Comercial que foi totalmente reformulada para um público que quer ouvir quase exclusivamente hits, à semelhança do que acontece com a RFM (novamente grupo Renascença); para finalizar também a intermitente emissão da Mix FM no Porto é alvo de crítica. O grupo MCR parece estar inconsistente e, a meu ver, limita-se a tentar seguir o rasto do grupo Renascença. Um tão elevado número de mudanças num período tão escasso não me parece boa política para manter e cativar ouvintes.
Fora do âmbito musical e também pela negativa fica o fim dos ciclos de cinema alternativo no Cine-Estúdio 222, também em Lisboa.

2003 foi também um ano de momentos muito positivos e que desejo que se voltem a registar em 2004. Seguindo a mesma ordem de temas que abordei acima, em termos de festivais foi extremamente positiva a forma como as novas bandas portuguesas passaram pelos palcos dos grandes festivais, contrariando os responsáveis dos grupos privados de rádio que dizem que as pessoas não querem ouvir nova música portuguesa e daí não investirem nela. Vejamos o caso dos EZ Special, por exemplo, uma nova banda e, a partir do momento em que cativaram os ouvidos dos responsáveis de marketing de um operador de telecomunicações, passaram a ter grande air-play em rádios que, por norma, fecham as portas a novos projectos. Mas falava eu dos festivais... O efeito não é propriamente surpreendente, tem vindo a crescer lentamente ao longo dos anos, e consiste na forma como as pessoas vêem as bandas nacionais. Se há três/quatro anos atrás um palco secundário estava sujeito a ter meia-dúzia de curiosos e amigos das bandas a observá-los, agora as pessoas já fazem uma certa questão em passar por lá com a curiosidade de conhecer. Este fenómeno registou-se particularmente na tarde de hip-hop do Festival Sudoeste, onde várias centenas de pessoas se apertavam dentro da tenda.
As Orquestras do Porto vão finalmente ter um espaço (ou já têm) decente para as suas actividades na tão polémica e atrasada Casa da Música. Finalmente alguma coisa em defesa dos músicos clássicos do Porto! Há já vários anos que eram pedidas instalações à Câmara Municipal mas esta nunca deu relevo à cultura. É um facto que o Porto tem problemas bem mais graves que precisam de ser solucionados mas também não se justifica que decisões de clubes de futebol já sejam tidas em conta e com prioridade para executivo camarário.
Na área das rádios foi o serviço público de rádio-difusão que esteve melhor. RDP Antena 1 com um leque mais alargado de nomes portugueses, programação mais abrangente e uma imagem mais jovem e, ao mesmo tempo, mais portuguesa. RDP Antena 2, até aqui limitada a composições clássicas e óperas, expandiu-se também à área do jazz (até aqui quase confinado aos "Cinco Minutos de Jazz" de José Duarte, no canal generalista da RDP). RDP Antena 3, mantendo a base estrutural herdada do Eng. Luís Montez, voltou a crescer na área dos programas temáticos e de autor.

Dito isto, vamos a discos... É habitual escolherem-se múltiplos de 5. Para não correr o risco de excluir algum disco que me agradasse nem escolher discos que não me marcaram particularmente, resolvi escolher meia-dúzia de discos que me surpreenderam de alguma forma.

Alla Polacca & StowawaysStowaways - "Why not you?" (Bor Land)
A Bor Land tem trazido para o panorama musical novos nomes e estilos. Se até Janeiro de 2003 a etiqueta de Rodrigo Cardoso contava apenas com compilações e um Split CD promocional, logo no primeiro mês deste ano lançou o trabalho de Old Jerusalem e fechou o ano com um duplo CD de Alla Polacca e Stowaways. Qualquer um dos discos poderia constar nesta lista mas foi a sonoridade dos Stowaways que me cativou e surpreendeu mais; por um lado fez-me reviver os meus primeiros anos de vida, os desenhos animados musicais e, por outro lado, abre portas para a (re)criação de estilos.
Blind ZeroBlind Zero - "A way to bleed your lover" (Universal Music)
Não é o meu trabalho preferido dos Blind Zero mas é um disco que deve fazer parte das prateleiras de quem procura os melhores trabalhos de música portuguesa, quanto mais não seja pelo simples facto de ser possível ouvir Jorge Palma a cantar em inglês naquele que considero ser o melhor tema do disco. As histórias em torno dos temas acabam por ser a maior mais-valia deste disco.
ToranjaToranja - "Esquissos" (Universal Music)
Lamentavelmente das poucas vezes em que vi os Toranja ao vivo, o som foi sempre de qualidade medíocre. O que me fez escolher este disco foi talvez a simplicidade das músicas. Não procuram fazer nada de novo e, ao mesmo tempo, são novidade. As músicas ficam agarradas ao ouvido como um cão agarrado a um osso. Se ao início não dei grande relevo à banda, comecei a pensar duas vezes quando dava por mim no chuveiro a cantarolar as músicas deles. Depois da passagem pelo Viva a Música, decidi que era definitivamente um disco a colocar entre os melhores do ano.
INFAMOUS & VRZINFAMOUS & VRZ - "100 Insultos" (Matarroa)
Este disco da editora-irmã da Bor Land (partilham as mesmas instalações da Sra. da Hora - Matosinhos) começou por causar impacto visual. A capa na foto aparenta um cinza escuro e preto banalíssimo mas o real é praticamente todo preto e as partes que se vêem a preto na imagem daqui têm uma camada plástica que reflecte a luz. Depois da apreciação estética o disco foi colocado no leitor de CDs.
O disco é um disco de hip-hop como muitos outros... São 18 temas sempre em torno do mesmo tipo de música e de vozes, o que não é de todo funcional. Ouvindo em blocos de 3 temas já resulta extremamente bem. Bons samples, uma produção de grande nível e convidados que dão a este disco um toque de elevada qualidade no hip-hop português.
Outros discos de hip-hop lançados este ano poderiam estar aqui mas este foi o que causou maior efeito surpresa, daí estar este e não Ace ou os Dealema neste lugar.
Big Fat MammaBig Fat Mamma - "Parece difícil" (Universal Music)
E esteve mesmo difícil para os Big Fat Mamma... Infelizmente nem o disco veio facilitar as coisas, com a banda a passar quase despercebida para a maioria das pessoas e a própria editora pouco ou nada fez para que as coisas pudessem ser diferentes. Este rock com sabor brasileiro merecia melhor sorte, quanto mais não seja pelo rigor com que os músicos fizeram o seu trabalho e pelas mais-valias trazidas pelos convidados.
Sérgio GodinhoSérgio Godinho - "O irmão do meio" (EMI - Valentim de Carvalho)
Não é um disco original no que concerne ao alinhamento mas estão aqui reunidos 15 dos melhores temas de sempre da carreira de Sérgio Godinho cantados ao lado de pessoas de realidades musicais diversas, onde Godinho e convidado(s) de cada tema dão uma roupagem diferente às canções. Vale a pena ouvir e comparar com os originais.


Opiniões e comentários aguardam-se.

Um Natal Sonoro para todos!

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